Era uma vez, o meu lugar. A árvore dos soldadinhos. Lá, a gente brincava de catar os militares insetos de patinhas pegajosas que voavam sem fazer barulho. Eu, o Thiaguinho, aquela menina loirinha e gripada, o menino maior, a sobrinha da Tia Gil. Eles não eram gigantes, mas deixavam a gente tão feliz. Apareciam em grupos. De longe, o pontinho branco que há nas suas asas lembram um olho. São pretos.
Ah, como é delicioso grudar dez ou menos soldadinhos nos braços, no rosto, nas pernas. Sentir suas perninhas de chiclete caminhando e, depois, vê-los partir. Distantes, voando distante. E esquecíamos. No outro dia, a Conceição nos levaria novamente ao quintal para colher pitangas para o suco do lanche. Subiríamos na mesa de concreto e lá estariam eles. De manhã, não. Não sei. Os encantados apareciam quando chegava o fim de tarde, antes de o sol pensar em deitar.
Era bonito, eles gostavam de mim, do menino que chegava mais tarde e que sempre vomitava na hora do almoço, da menina que tomava banho de calcinha, da Ana. Às vezes, comíamos biscoito maisena com suco de maracujá e levávamos para os soldadinhos. Educados, preocupados, rejeitavam. Queriam nos ver fortes e felizes, não aceitavam nem as migalhas. Gostava de olhar para o céu sem sereno, azul como meu lápis de cor azul, coalhado de nuvens branquinhas. A visão se dava através das folhas verdes. Que árvore era aquela? Não tinha frutos, só soldadinhos.
Dia desses, perguntei a minha mãe:
- Como é o nome daquele bicho que tem as patas pegajosas, é preto e tem um ponto branco no meio?
Ela:
- Soldadinho?
- Científico, mãe.
Sei não. Nunca soube. Contentei-me em senti-lo no corpo e nas lembranças, mesmo sem nunca saber seu nome. Ainda gosto deles, ainda não os encontrei por aqui, na nova cidade. Meus soldadinhos devem continuar brotando naquela árvore plantada na casa da Fada Madrinha, caminhando pela mesinha de cimento, voando para as pitangueiras e pés de carambola. Pousando em pedras, no verso das folhas. Não mais em crianças.
Um comentário:
cool cool!
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