segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

APOSENTADOS VIA SATÉLITE

Eu realmente não sei quando vou me aposentar. Sei que existe uma legislação para isso, mas só vou começar a calcular o dia em que vou parar de trabalhar para curtir netos, livros e afins dentro de alguns anos. Na verdade, nunca havia me imaginado aposentada, senhora, andando devagar, com a pele cheia de desenhos do tempo.
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Não gosto de tirar xerox. E não é por nenhum motivo do tipo: "prefiro coisas originais, porque as cópias tiram a essência blá-blá-blá". Não estou falando de xerox de um livro. Eu não gosto porque sempre que preciso fazer uma fotocópia de uma magra folha, passo dezenas de minutos aguardando. A última vez, foi na semana passada.
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Minha mania de sair atrasada de casa é crônica e deixar tudo para o segundo final também. Mas eu só precisava tirar cinco cópias de um documento e correr para entregá-lo. Tamanha foi minha surpresa quando me deparei com uma fila imensa de pessoas com cabelinhos brancos, roupas de listras ou minúsculas flores, numa papelaria do Centro da cidade.
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Ficamos amontoados entre cadernos, agendas, tintas coloridas e papéis ondulados com defeito - e 50% de desconto. Na parede, um cartaz avisava: "Sorria, você está sendo filmado via satélite".
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Enquanto aguardava, eu pensava em uma música sem letra. Já chateada com a demora do rapaz que parecia estar quebrando a máquina de xerox, lembrei de um rock cheio de berros que ouvia na adolescência. O silêncio se instalou na minha cabeça quando comecei a ouvir a conversa do senhor que estava na minha frente.
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- Moço, são duas cópias do CPF, do RG e faz também do comprovante de residência. Virou para mim e disse: - Pois é, agora tenho que provar para o banco que estou vivo. Só recebo minha aposentadoria assim.
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Passei então a observá-lo. Magro, aparentemente saudável e ajeitando sem parar um cordão que improvisou para segurar o boné na cabeça. A esposa dele, vestida de flores e calça confortável, carregava documentos amarelados e orientava o funcionário da papelaria a copiar as certidões da época que a república tupiniquim se chamava "ESTADOS UNIDOS DO BRASIL".
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Sim, eles estão vivos e eu sou testemunha. Eu e a papelaria que os registrou via satélite.

3 comentários:

Kassia Nobre disse...

Paulinhaaaa

adoro suas observações do dia-a-dia..imagino vc com o olhar todo curioso observando os velhinhos...e eles parecem que sabem q vc está olhando porque sempre puxam um papo..né?

haha

bjão amiga

Isabela Barbosa disse...

Minha Pequena, olha quem está por aqui?!
E, digo logo de cara que eu sempre adoro seus textos, agora vou além de acompanhá-los, comentar aqui!


beijinhoooos.

Estêvão dos Anjos disse...

AAAAAAAAAAAHHHHHHHH

Pior que isso é você tirar cópia de certidão de nascimento :p